sábado, 25 de abril de 2009

A Figueira e a revolução de Abril

REGIMENTO DE ARTILHARIA PESADA 3
RELATÓRIO
...Iniciado o levantamento militar com a detenção dos oficiais de serviço e com a prisão do Coronel Aires de Figueiredo por mim pessoalmente efectuada às 3 horas da manhã do dia 25 de Abril tratei Imediatamente de acordar o restante pessoal e activá-lo, Iniciativa francamente favorecida pelo trabalho de mentalização anterior a este dia. A saída da coluna do quartel já devidamente municiada e ainda organizada só foi possível com o clarear do dia dadas as dificuldades levantadas pela existência de uma profunda escuridão nesse dia. Contribuíram para este ligeiro atraso, a necessidade de arrombar paióis e a falta desesperada de quadros: os cabo milicianos não pernoitavam no quartel a adesão dos sargentos era duvidosa, a adesão dos oficiais do serviço geral era decerto negativa os oficiais milicianos pouco Informados dos pormenores operacionais que possibilitariam avaliar as possibilidades de êxito era parcial embora restassem poucas dúvidas sobre a boa vontade em aderir e o facto de sermos apenas dois capitães do Movimento neste quartel: Capitão de Artilharia Eduardo Diniz Leitão dos Santos Almeida e Capitão de Artilharia Fausto Almeida Pereira.
No próprio dia 25Abr74, o Comando desta Unidade, ao ser Instado pelo Sr. Alf. Santos. oficial cripto do Regimento para definir via rádio a sua posição, acabou por ceder dando ordem para transmitir a adesão da Unidade ao M.F.A.; mas só em último lugar ... em último não que dá muito nas vistas; ... penúltimo .. penúltimo lugar é melhor ... Este exemplo está longe de ser um acto isolado .. Chegámos a Peniche cerca das 11 horas desse dia, e ficou assente que grosso da coluna devia seguir para Lisboa ficando em Peniche o Capitão Rocha dos Santos com uma companhia de Infantaria reforçada com duas secções de obuses comandadas pelo Asp. Monteiro. Chegados a Lisboa cerca das 17 horas, assistimos à imediata adesão do R.A.L. nº 1, para a qual não chegámos a contribuir, ficando pois o mérito desta adesão devido à própria Unidade e não à nossa chegada. Avançámos pelas ruas de Lisboa à espera de resistência que felizmente não viemos a encontrar. Posteriormente, a chuva, a falta de cobertores e abastecimentos. o cansaço dos homens e principalmente o facto de Já não ser necessária a nossa actuação, Além do adiantado da hora, levaram-me a decidir proporcionar aos militares sob o meu comando um merecido e necessário repouso, a fim de permitir manter o grau de operacionalidades as circunstâncias impunham. Aquartelados no R.A.L. 1, limitámo-nos nos dias subsequentes a detenções de FACs e Gls. Sem mais acções de realce, ocupámos posteriormente o Quartel da Ex-Legião Portuguesa, tendo mandado recolher ao Quartel 3 baterias, ficando apenas com uma bateria operacional. Circunstâncias várias, entre as quais avultam diminutos efectivos presentes face a um grande número de serviços retiraram a esta Bateria de Intervenção o grau de operacionalidade anteriormente obtido. O número reduzido de homens do R.A.P. n.º 3 presentemente em serviço na Legião deve-se ao facto de ter mandado regressar à Unidade a maior parte dos militares da mesma, a fim de permitir o regular funcionamento da mesma, porque mesmo os que neste aquartelamento ainda se encontram, fazem falta ao regular andamento dos serviços, estando por Isso previsto o seu regresso em breve...
...Todos os oficiais e sargentos milicianos bem como os praças presentes no quartel aderiram imediatamente e se colocaram inteiramente à nossa disposição. A coluna de Aveiro entrou para o quartel aguardando a preparação da coluna do R.A.P. 3 e a chegada da coluna do C.I.C.A 2 e do R.1. 14. Entretanto assumia o Comando do R.A.P. 3 o Capitão Ferreira da Cal, como oficial mais antigo, que juntamente com o Cap. Moço e Ten. Garcia haviam vindo de Águeda. A coluna foi formada rapidamente; a colaboração de todos foi admirável. Do R.A.P. 3 saíram 6 bocas de fogo 10,5 cerca de 300 homens transportados em 40 viaturas. A coluna do C.I.C.A. 2 entrou no R.A.P. 3 pelas 6 horas. Esperava-se pela do R.1. 14 que não chegara ainda. Pelas 7 horas saiu a coluna em direcção a Leiria e um quarto de hora depois aparecia do R.1. 14 que se lhe foi juntar no percurso. Constituiu-se assim o -Agrupamento NOVEMBER- com cerca de 60 viaturas e mais de 500 homens. - A partir desta altura a vida da unidade decorreu normalmente sem os oficiais superiores que entretanto ficaram em casa bem como a grande maioria dos restantes oficiais e sargentos do O.P. A porta de armas manteve-se fechada. O pessoal que seguiu na coluna com os objectivos de Peniche e Lisboa permaneceu na capital sendo substituído em 27/4 por uma outra bateria que continuou sob o comando do Cap. Dínlz de Almeida. - Destacava-se além da grande actividade desenvolvida pelo Cap. Diniz de Almeida que deverá ser analisada a nível superior, a dedicação que o aspirante Mil. Matos pôs nas tarefas que lhe confiei sendo de uma voluntariedade admissível e digna de ser realçada sua actividade teve grande Influência para o excelente desencadeamento da manobre que se Iniciou na Figueira da Foz. Poderei ainda mencionar o Asp. Mil. Borges pela excelente colaboração que me prestou. O 1º cabo Mil. Vitorino foi também muito Influente na boa concretização dos pormenores prontificando-se a dormir sempre no quartel desde que eu lho ordenei embora tivesse quarto fora. Poderia mencionar ainda o nome de todos os militares que comigo colaboraram nos preparativos da coluna e ainda os que abnegadamente fizeram alguns serviços seguidos sem nunca por Isso terem manifestado o mais leve desagrado.
Figueira da Foz, 1 de Maio de 1974.
FAUSTO ALMEIDA PEREIRA, Cap. de Artilharia

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