Os
fantasmas
Esta
coisa
de
escrever
crónicas
“é
um
jogo
permanente
entre
o
estilo
e
a
substância”.
Uma
luta
entre
“o
deboche
estilístico”
do
gozo
da
escrita
e
“a
frieza
analítica”
do
pensamento
do
cronista.
Por
isso,
enquanto
cidadão,
só
posso
ver
este
governo
como
uma
verdadeira
praga
bíblica
que
caiu
sobre
um
povo
que
o
não
merecia.
Mas,
enquanto
cronista,
encaro-‐
o
como
uma
dádiva
dos
céus,
um
maná
dos
deuses,
“um
harém
de
metáforas”,
uma
verdadeira
girândola
de
piruetas
estilísticas.
Tomemos
como
exemplo
o
ministro
Gaspar.
Licenciado
e
doutorado
em
Economia,
fez
parte
da
carreira
em
Bruxelas
onde
foi
director
do
Departamento
de
Estudos
do
BCE.
Por
cá,
passou
pelo
Banco
de
Portugal,
foi
chefe
de
gabinete
de
Miguel
Beleza
e
colaborador
de
Braga
de
Macedo.
É
o
actual
ministro
das
Finanças.
Pois
bem.
O
cronista
olha
para
este
“talento”
e
que
vê
nele?
Um
retardado
mental?
Uma
rábula
com
olheiras?
Um
pantomineiro
idiota?
Não
me
compete,
enquanto
cidadão,
dar
a
resposta.
Mas
não
posso
deixar
de
referir
a
reacção
ministerial
à
manifestação
de
15
de
Setembro
que,
repito,
adjectivava
os
governantes
onde
se
inclui
o
soporífero
Gaspar,
como
“gatunos,
mafiosos,
carteiristas,
chulos,
chupistas,
vigaristas,
filhos
da
puta”.
Pois
bem.
Gaspar
afirmou
na
Assembleia
da
República
que
o
povo
português,
este
mesmo
povo
português
que
assim
se
referia
ao
seu
governo,
“revelou-‐se
o
melhor
povo
do
mundo
e
o
melhor
activo
de
Portugal”!
Assumpção
autocrítica
de
alguém
que
também
é
capaz
de,
lucidamente,
se
entender,
por
exemplo,
como
um
“chulo”
do
país?
Incapacidade
congénita
de
interpretar
o
designativo
metafórico
de
“filhos
da
puta”?
Não
me
parece.
Parece-‐
me
sim
um
exercício
de
cinismo,
sarcástico
e
obsceno,
de
quem
se
está
simplesmente
“a
cagar”
para
o
povo
que
protesta.
A
ser
assim,
julgo
como
perfeitamente
adequado
repetir
aqui
uma
passagem
de
um
texto
em
forma
de
requerimento
“poético”
de
1934.
Assim:
“A
Nação
confiou-‐
-‐
lhe
os
seus
destinos?...
/
Então,
comprima,
aperte
os
intestinos.
/
Se
lhe
escapar
um
traque,
não
se
importe…
/
Quem
sabe
se
o
cheirá-‐
lo
nos
dá
sorte?
/
Quantos
porão
as
suas
esperanças
/
Num
traque
do
ministro
das
Finanças?...
/
E
quem
viver
aflito,
sem
recursos
/
Já
não
distingue
os
traques
dos
discursos.”
Provavelmente
o
sr.
ministro
desconhecerá
a
história
daquele
gajo
que
era
tão
feio,
tão
feio,
que
os
gases
andavam
sempre
num
vaivém
constante
para
cima
e
para
baixo,
sem
saber
se
sair
pela
boca
se
pelo
ânus,
dado
que
os
dois
orifícios
esteticamente
se
confundiam.
Pois
bem.
O
sr.
ministro
é
o
primeiro,
honra
lhe
seja
concedida,
que
já
confunde
os
traques
com
os
discursos.
Os
seus.
Desta
vez,
o
traque
saiu-‐lhe
pelo
local
de
onde
deveria
ter
saído
o
discurso!
Ou
seja
e
desculpar-‐me-‐ão
a
grosseria
linguística,
em
vez
de
falar,
“cagou-‐se”.
Para
o
povo
português.
Lamentavelmente.
Outro
exemplar
destes
políticos
que
fazem
as
delícias
de
um
cronista
é
Cavaco
Silva.
Cavaco
está
politicamente
senil.
Soletra
umas
solenidades
de
circunstância,
meia-‐dúzia
de
banalidades
e,
limitado
intelectualmente
como
é,
permanece
“amarrado
à
âncora
da
sua
ignorância”.
Só
neste
contexto
se
compreende
o
espanto
expresso
publicamente
com
“o
sorriso
das
vacas”,
as
lamúrias
por
uma
reforma
insuficiente
de
10
mil
euros
mensais,
a
constante
repetição
do
“estou
muito
preocupado”
e
outros
lugares-‐comuns
que
fazem
deste
parolo
de
Boliqueime
uma
fotocópia
histórica
de
Américo
Tomás,
o
almirante
de
Salazar.
Já
o
escrevi
aqui
várias
vezes.
Na
cabeça
de
Cavaco
reina
um
vácuo
absoluto.
Pelo
que,
quando
fala,
balbucia
algumas
baboseiras
lapalicianas
reveladoras
de
quem
não
pode
falar
do
mundo
complexo
em
que
vivemos
com
a
inteligência
de
um
homem
de
Estado.
Simplesmente
porque
não
a
tem.
Cavaco
é
uma
irrelevância
de
quem
nada
há
a
esperar,
a
não
ser
afirmações
como
a
recentemente
proferida
aquando
das
comemorações
do
5
de
Outubro
de
que
“o
futuro
são
os
jovens
deste
país”!
Pudera!
Cavaco
não
surpreenderia
ninguém
se
subscrevesse
por
exemplo
a
afirmação
do
Tomás
ao
referir-‐
se
à
promulgação
de
um
qualquer
despacho
número
cem
dizendo
que
lhe
fora
dado
esse
número
“não
por
acaso
mas
porque
ele
vem
não
sequência
de
outros
noventa
e
nove
anteriores…”
Tal
e
qual.
Termino
esta
crónica
socorrendo-‐
me
da
adaptação
feliz
de
um
aforismo
do
comendador
Marques
de
Correia
e
que
diz
assim:
“Faz
de
Gaspar
um
novo
Salazar,
faz
de
Cavaco
um
novo
Tomás
e
canta
ó
tempo
volta
para
trás”.
É
que
só
falta
mesmo
isso.
Que
o
tempo
volte
para
trás.
Porque
Salazar
e
Tomás
já
os
temos
por
cá.
P.S.:
Permitam-‐me
a
assumpção
da
mea
culpa.
Critiquei
aqui
violentamente
José
Sócrates.
Mantenho
o
que
disse.
Mas
hoje,
comparando-‐o
com
esse
garotelho
sem
qualquer
arcaboiço
para
governar
chamado
Passos
Coelho,
reconheço
que
é
como
comparar
merda
com
pudim.
Para
Sócrates,
obviamente,
a
metáfora
do
pudim.
Sinceramente,
nunca
pensei
ter
de
escrever
isto.
Luís
Manuel
Cunha
Professor
In
“Jornal
de
Barcelos”
de
10.10.2012
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